sábado, 18 de julho de 2009

Texto sobre Conselho Tutelar

O Conselho Tutelar na Defesa dos Direitos das crianças e adolescentes[1]

O que é o Conselho Tutelar? Para que serve? Qual é a sua função? Quando devo acioná-lo? Essas são as perguntas que mais nos aparecem, e sobre as quais as dúvidas e as discordâncias nos indicam a ocorrência dos maiores ‘problemas’ e das maiores divergências e críticas na relação que se estabelece entre o Conselho Tutelar, a família, a sociedade e o Poder Público. Para responder a esses questionamentos de forma que todos compreendam o significado e a importância do Conselho Tutelar, destacaria a necessidade de observarmos o que nos ensina o Estatuto da Criança e do Adolescente, a Doutrina e a Jurisprudência sobre ele construída.
A primeira coisa que chamo à atenção é a denominação deste novo órgão: Conselho Tutelar. A palavra conselho designa "assembléia em que se toma deliberação a respeito de assuntos submetidos a sua apreciação". Isso oferece-nos um caráter de uma ação coletiva, e não individual. Um Conselho é um grupo de pessoas em que seus membros não atuam sozinhos, mas somente em grupo, pois é na ação conjunta que está a sua característica diferencial. O Conselho é ainda Tutelar, o que significa proteger. O Conselho Tutelar não tutela os sujeitos dos direitos (isso é assistencialismo), mas os direitos dos sujeitos, que devem ser assegurados com absoluta prioridade pela família, pela comunidade, pela sociedade em geral e pelo Poder Público.
O Conselho Tutelar é permanente, não porque deva funcionar 24 horas por dia (o que é exigível apenas dos serviços de atendimento), mas porque ‘veio para ficar’, não estando à sorte ou vontade do Prefeito, desta ou daquela autoridade. E também autônomo, sendo sua autonomia expressa de duas formas: a) como vai atender suas atribuições e que ações irá realizar; b) que medidas irá aplicar e quando é o momento para aplicá-las. Em ambos os casos, não poderá existir interferência. Por último, o Conselho Tutelar é um órgão não jurisdicional, não pertencendo ao Poder Judiciário nem lhe sendo subordinado. É um órgão administrativo, vinculado ao Poder Executivo Municipal para efeito operacional.
A sua função não é atender direitos; é zelar para que, quem deva cumpri-los, efetivamente os cumpram. Por isso, os conselheiros tutelares necessariamente não precisam ser técnicos, nem ter qualquer formação universitária ou curso superior. A sua finalidade é zelar, é ter um encargo social para fiscalizar se a família, a comunidade, a sociedade em geral e o Poder Público estão assegurando com absoluta prioridade a efetivação dos direitos das crianças e dos adolescentes, cobrando de todos esses que cumpram o Estatuto e a Constituição Federal. Este é o Conselho Tutelar que muda usos, hábitos e costumes em relação à criança e ao adolescente, cotidianamente enxergados como objetos, indivíduos incapazes e passíveis de medidas jurídicas e sociais julgadas de seu melhor interesse. O Conselho Tutelar não se caracteriza por atender direitos não atendidos, não cumpridos ou não satisfeitos regularmente por quem tinha o dever de cumprir; não é um órgão que age em substituição ou como uma conditio sine qua non para se obter os direitos que já estão assegurados na lei; é sim um órgão que tem as funções de:
Como podemos observar, o capital indispensável ao desempenho de todas essas ações do conselheiro tutelar é o político e não o técnico; ele deve ser um líder, deve ser representativo, capaz de conseguir uma alteração de comportamento, de visão e de trato com os direitos das crianças e dos adolescentes; capaz de introduzir e firmar o novo paradigma deles enquanto cidadãos, alcançando-lhes dedicações e destinações privilegiadas por parte da família, da sociedade e do Estado, cumprindo-se o próprio Estatuto. Isso não afasta que o conselheiro tutelar seja um técnico, ou mesmo um intelectual, nem significa que o conselheiro não deva se capacitar permanentemente. Capacitação e assessoria são fundamentais.
O que referimos é sobre como estas devem se dar, notadamente para que o Conselho Tutelar possa continuar a atender as suas finalidades e objetivos. Sabemos que a Doutrina e a Jurisprudência têm admitido, através da aprovação de lei municipal, a ampliação dos requisitos estatutários previstos para o cargo de conselheiro tutelar, tidos como mínimos, dada a imensidão do nosso país, o número de Municípios, a diversidade e a complexidade das suas demandas, contudo, não podemos nos afastar da essência política do seu papel, nem começar a lhe exigir conhecimentos e saberes eminentemente técnicos, porque lhe está sendo destinado, ou lhe vem sendo exigido o desempenho de um serviço de atendimento.
Voltamos a afirmar: todas as necessidades das crianças e dos adolescentes devem ser atendidas junto à família, à sociedade e ao Estado, e não junto ao Conselho Tutelar, que só será chamado a atuar quando quem tinha que cumprir seu dever não fez, ou o fez de forma irregular. Se a criança precisa de creche e o adolescente precisa de escola, esses seus direitos devem ser cumpridos pela família, pela sociedade e pelo Estado. Não há segredo nisso, basta que todos cumpram com os seus deveres. Ao direito de cada criança e adolescente, corresponderá um dever da família, da sociedade e do Poder Público, que deverão ser fiscalizados pelo Conselho Tutelar. Assim, o direito de ter educação escolar corresponde ao dever de ensiná-lo, só se cumprindo esse dever quando efetivada a educação.
O Conselho Tutelar nunca pode ser o primeiro local a ser procurado, ele não é o pronto-socorro, senão da cobrança da responsabilidade dos devedores pelo atendimento do direito. Se há necessidade de saúde (violência sofrida), que se chame a urgência médica, o pronto-socorro técnico de saúde; se há necessidade de segurança (manutenção da ordem, contenção da violência), que se chame o pronto-socorro técnico e aparelhado da polícia; se surge uma necessidade pedagógica (mau comportamento, problemas de aprendizagem), que se chame o pronto-socorro técnico de orientação educacional; se vemos a necessidade de abordagem (mendicância, exploração, vícios), de estudo social (verificação das condições da família), de inclusão em programas sociais de promoção e defesa assistencial, que se chame o pronto-socorro técnico do serviço social; se temos necessidade da imposição de limites (rebeldes, desobedientes), que se chame o pronto-socorro técnico de psicologia, e ai por diante. Todos esses pronto-socorros devem existir e estar à disposição para o atendimento das ameaças e violações sofridas pelas crianças e adolescentes, sendo o papel do Conselho Tutelar fiscalizar pelo eficiente funcionamento do Sistema de Proteção Integral.
O Conselho Tutelar só deve agir e se necessário for - após a família, a comunidade, a sociedade e o Poder Público cumprirem com seus deveres. Após estes terem procurado todos os recursos para o atendimento dos direitos e das necessidades das crianças e dos adolescentes, o que pode significar mover suas próprias ações. Somente diante da omissão de algum dos devedores, ou se negado o direito a ser protegido, é que o Conselho Tutelar utilizará seu poder de obrigação e advertência aos pais ou responsável, e ainda a requisição dos serviços públicos, o que não consiste em simples cobranças ou solicitações, mas representam medidas aplicadas pelo Conselho e ordens a serem cumpridas, em decisões oponíveis apenas pela revisão da autoridade judiciária. Essa posição do Conselho Tutelar provoca a efetiva mudança social, promove a instalação do novo e trabalha a consciência da criança e do adolescente enquanto cidadãos.
Então, se a necessidade a ser atendida exige um técnico, obtenha-se o técnico; se é preciso um programa, obtenha-se o programa; se eles não existem ou se são poucos, comunique-se ao Conselho Tutelar e ao Ministério Público para que tomem as devidas providências nas áreas de suas competências (requisições, representações e ajuizamentos), bem como mobilize-se sua comunidade para oferecer sua contribuição, além de ir solicitar aos Conselhos de Direitos o direcionamento das suas políticas, municipal e estadual, e de ir pressionar o Poder Público para a garantia e a ampliação do atendimento de todos os direitos definidos no Estatuto.
A solução para o atendimento dos direitos é a requisição do Conselho? Não, é a mudança de visão da nossa responsabilidade para com o problema. Assim, a falta de obtenção da proteção ao direito não seria uma falha do Conselho, mas uma falha do sistema, que continua não priorizando essa proteção. Sem um serviço, sem um programa, sem um técnico ou sem uma família, que se engajem e assumam efetivamente suas responsabilidades e suas obrigações, nada se resolverá para a criança. O Conselho Tutelar não vai educar o filho para o pai, dizendo que é muito cedo para namorar; não vai oferecer cesta básica para a família, nem vale-transporte; não vai fazer terapia, não vai prestar orientação educacional, não vai medicar ou utilizar a força.
O Conselho Tutelar não é eminentemente técnico, para enfrentar questões técnicas, e sim essencialmente político, para enfrentar questões políticas. E um mobilizador, um articulador, um verdadeiro conselheiro, que define as coisas em Conselho e com fundamento na sua representação e no seu saber popular e comunitário. O Conselho Tutelar é autônomo exatamente por isto, para que não exista vinculação político-partidária ou subordinação aos governantes e às demais autoridades municipais; para que não haja submissão aos interesses elitistas que excluem e que continuam a passar a visão da criança e do adolescente como uns coitados e não como cidadãos, situações estas que não lhe permitiriam cumprir com fidelidade o seu papel de proteger e defender os direitos da criança, do adolescente e de suas famílias. Órgão que surgiu em decorrência do acolhimento do princípio constitucional da participação popular nas ações do Poder Público, o Conselho Tutelar é escolhido e composto pelo povo, sendo Estado, mas não Governo. Ele exerce parcela do poder estatal na área que respeita a garantia de direitos, a proteção e a defesa dos direitos da criança e do adolescente.
A eficácia das ações do Conselho Tutelar depende de ele conseguir firmar o novo paradigma, obtendo uma efetiva mudança das visões social e política acerca dos direitos da criança e do adolescente, que devem passar a ser vistos como prioridade absoluta, não só na Lei Federal, na teoria utópica e no discurso fácil, mas no dia-a-dia de nosso relacionamento com eles, nos nossos contatos pessoais ou profissionais, assegurando-lhes todos os privilégios e as preferências expressas na lei. Além disso, há a exigência de sérios investimentos públicos e comunitários na criação e implementação de programas e serviços que promovam e atendam a universalidade dos direitos das crianças e dos adolescentes. E, por terceiro, imprescinde do fiel cumprimento do papel estatutário destinado ao conselheiro tutelar; esse, talvez, o ponto para avaliar a capacidade e a competência do conselheiro. Um Conselho Tutelar fraco, sem representatividade social, não cumprindo o seu papel e realizando ações técnicas sem qualquer conhecimento mais profundo e sem a mínima qualidade, não cobrando de quem deve atender, não responsabilizando os omissos e irregulares, não mudará o sistema, pelo contrário, o manterá, perpetuando a visão da criança e do adolescente como objetos da vontade social e dos Governos. Somente um Conselho Tutelar forte, atuante nos limites do seu verdadeiro papel, autônomo e representativo de sua comunidade, é que poderá confirmar ou não a sua validade no Brasil, introduzido pelo legislador para figurar como um dos mais importantes órgãos chamados a garantir a absoluta prioridade e a proteção integral dos direitos das crianças e adolescentes.
[1] André Karst Kaminski, advogado e ex-coordenador da Corregedoria dos Conselhos Tutelares de Porto Alegre – RS.
Olá Conselheiros e Conselheiras, vamos acessar mais o nosso blog e passar a trocar informaçoes sobre o nosso trabalho.
Um forte abraço,
Conceição Eliana Carneiro

sábado, 27 de junho de 2009

Pessoal, segue aí o vídeo que a gente utilizou na capacitação sobre a questão da solidariedade. E aí como estão os Planos de Ação de vocês?

quarta-feira, 3 de junho de 2009

Projeto capacita Conselheiros de 229 municípios baianos



Após percorrer metade do Estado da Bahia para diagnosticar a situação da infância e adolescência nos municípios, tem início a segunda etapa de atividades do projeto Formação para a Criação e Gestão Qualificada de Conselheiros de Direitos e Tutelares no Estado da Bahia.


Financiado pela Secretaria Especial dos Direitos Humanos da Presidência da República e com o apoio do Conselho Estadual da Criança e do Adolescente (CECA), o projeto tem como objetivo contribuir para a melhoria da execução da política de atendimento à criança e ao adolescente, além de subsidiar os Conselheiros para uma atuação mais qualificada. Até o mês de agosto serão realizadas 60 capacitações, envolvendo diretamente 2.977 Conselheiros de Direitos e Tutelares.

A primeira atividade desta etapa foi realizada no mês de abril, na cidade de Feira de Santana, e reuniu 42 Conselheiros dos municípios de Santa Bárbara, Tanquinho, Santanópolis e Irará.

Reafirmando a importância dos Conselhos – Após a devolução do diagnóstico, elaborado a partir das visitas realizadas no ano de 2007, os participantes foram convidados a refletir sobre a situação atual da infância e adolescência nos municípios onde atuam. De modo geral, desde a primeira visita realizada, houve avanço, mas, muito ainda precisa ser feito, como por exemplo, oferecer infra-estrutura necessária para que os conselheiros desempenhem sua função.

Função que era desconhecida por alguns participantes, sobretudo os que integram os CMDCA’s. Eles afirmaram não saber da importância e responsabilidade de ser Conselheiro, pensando que a representação significava apenas assinar ata de reuniões em que não estiveram presentes. “Os Conselhos foram criados para que o povo tenha a oportunidade de participar do poder. Hoje no Brasil existem mais de cinco mil conselheiros. Em nossos municípios têm mais conselheiros do que vereador e, no entanto, não conseguimos exercer este poder e proporcionar as mudanças que queremos”, disse Eliana Carneiro, coordenadora do programa Criança e Adolescente do MOC e uma das facilitadoras da oficina.

Conselheira Tutelar no município de Santanópolis, Alcilene Sampaio afirma que vai colocar em prática tudo o que aprendeu. “Já participei de alguns seminários sobre Conselho Tutelar, mas, nenhum tão esclarecedor como este. Nós temos um compromisso com a criança e o adolescente, não posso chegar no meu município e agir como antes”, desabafa a Conselheira. Em Santanópolis, o Conselho Tutelar, criado em 2007, funciona em situação precária o que dificulta o trabalho. O Ministério Público já acionou a Prefeitura Municipal para realizar o investimento, mas até agora nada foi feito.

Representante do CMDCA de Tanquinho, Roseval Santos fala da importância das capacitações para os Conselheiros. “Isto que o MOC está fazendo é fundamental para o nosso trabalho. Sabemos que existem muitos culpados nesta história, mas a culpa é também dos Conselheiros que não têm conhecimento do seu papel e não procuram se informar. Esta capacitação está mostrando a importância do nosso papel em representar e lutar pelos direitos das crianças e adolescentes”, conta Roseval.


Coordenador de um projeto que beneficia 100 crianças da zona rural de Tanquinho, Roseval afirma desenvolver as atividades contando apenas com o trabalho voluntário de três pessoas, sem qualquer apoio financeiro. Para ele, em Tanquinho a criança e o adolescente não são prioridades, mas, tem esperança que a situação melhore com a nova gestão. “Apesar das dificuldades, tenho que reconhecer que o Conselho Tutelar está prestando um serviço bom às famílias. O grande problema é a falta de políticas específicas para a infância e adolescência”, revela.


Os Conselheiros afirmaram que outro grande aprendizado foi sobre o Fundo da Infância e Adolescência (FIA). Nestes municípios o FIA já está criado, mas a “tarefa de casa” dos participantes é descobrir se já está regulamentado e quem está gerindo o recurso. “Sou do CMDCA e para mim o FIA foi uma grande surpresa. Assim que voltar para Tanquinho vamos nos reunir e procurar saber se o FIA existe ou não”, disse Roseval.


Além de um banco de dados com as informações levantadas no diagnóstico, após a realização de todas as capacitações será criado o “Blog dos Conselhos”, para que os participantes das oficinas possam continuar trocando experiências e informações.